Conversa de ném.

Antes de qualquer coisa quero dizer que não tenho preconceito nenhum, nenhum, nenhum. Só “admiro” o dialeto que tal classe emprega e rio (morro) ao ouvir tais atrocidades na rua, no ônibus, no metro e principalmente no trem.

Aviso de pronto: qualquer semelhança com a vida real não será mera coincidência.

Conversa de ném.

Faz-se uma bela manhã ensolarada e é uma típica segunda-feira, onde se lava as roupas do final de semana. Cleudineuza sobe “pracima” da “lagi” e “cumeça” a “instender” a roupa molhada, torcida, amarrotada e pingando no varal. Na laje vizinha, Marlucy também segue o mesmo ritual.

Não sei se é um estigma social, mas elas não sabem falar baixo, mesmo que a distância física entre uma e outra seja mínima. Então, Cleudineuza, aos berros, diz:

- E aí ném! Já levou as criança na creche?

- Minina do céu, nem te conto. Rubevaldo pegou disenteria e ta de cama e de vaso. Mandei Riquelmi, Matheus e Jonas pra escola sozinho e fiquei cuidando do meu minino.

- Jesus, Maria, José! Leva logo no posto, mozão, vaiquédengue?

- Ai minina, viréçabocapralá! Grace Kelly mês passado pegou e quaismorreu.

Era roupa, balde, pregador e corda que não acabavam mais, afinal, somando ambas tinham 12 filhos. Fora os maridos, os netos e os agregados que moram no puxadinho.

- Mas e aquele churrasco aí na sua laje Cleudi? – perguntou Marlucy, carinhosamente, chamando a amiga pelo apelido.

- Ain amigãn, acho que vai rolar esse domingo, porque no sábado eu vou pro Castelo. Mas já mandei Romildo, meu marido, montar e limpar a piscina de prásco. Até comprei nosso brondo e a água cigenada na Paxeco. Os minino mais novo tão tudo animado. Vou amanhã no Guanabara comprar arzasa, arlingüiça, orcoração e arcarne – como se asa e coração não fossem carnes.

- Ai ném, não vai terça não. Terça é dia da padaria e laticinho. Deixa pra ir na quinta que é dia da carne! Mas vai cedo porque a fila é enorme, esse povo favelado vai tudo lá fazer vergonha.

- É mermo né? Indabem cágente não somassim... Temu catiguria.

- É...

- Mas vem cá Lucy, você vai vim de mão abananu? E os Garavitão quio mandei você trazê? Pode tratanu de comprá. Garavitão e Dolly, porque meus menino tem alergia a Coca. - Ainda são metidos a besta? Como ousam serem alérgicos à Coca? - Se tamém puder comprá uns pacotinho de Torcida e Fofura pro tiragosto...

- Ah mozão, levo sim, podexá. Os amiguinho do meu menino mais velho interceptaro o camião e ele trouxe nove caixaquipracasa de Garavitão. Vôvê se um dia desses vou na praia vender alguns. Os Torcida eu tenho aqui na tendinha.

- Mim chama que eu vo junto ném! Marzagora deixeu ir lá porque tenho que aprontar o almoço. Tchau Lucy, melhoras pro seu minino.

- Ah, brigado Cleudi. Beijo nas criança.