segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Sentido e Contido



– Acorda, já são quatro da manhã... A gente vai chegar atrasado...

Puta saco. Pleno dia de não-aula ter que ir me apresentar na junta militar. Sem contar o fato de eu não saber chegar onde eu teria que me apresentar.

Como ainda eram quatro e pouquinho, resolvi entrar na internet, enquanto tomava meu café da manhã, pra distrair a tensão que seria o resto do dia. Por incrível que pareça, ainda tinham uns remanescentes on-line com os quais pude desabafar (de novo) meu desagrado.

As bizarrices começaram a partir do momento em que eu pus meu pé fora de casa. Tava uma manhã bastante escurecida, com uns rastros meio cinza perolado. Não havia nem um sinal de raios avermelhados sinalizando o começo do dia, embora o calor já fosse infernal, digno de meio-dia.

Passando pela Praça-seca o palco do circo do “show-de-horrores” tava armado. Em plena segunda feira um bando de bichas trapulentas, mal tratadas, esculachadas e afetadas parecia que emergiam da rua da boate 1140 para os pontos de ônibus. Tinha uma que particularmente me deu muito medo, mais ainda pelo fato de ter ficado me olhando quando o ônibus em que eu estava parou no ponto. Era uma bicha da cara torta, meio mal diagramada, com uma mancha que ia do nariz (por sinal também muito torto) até a cabeça, ocupando todo o espaço do globo ocular e adjacências... Era treva, a visão do inferno na Terra.

Ledo engano meu achar que as coisas iam melhorar... Na verdade eu já sabia que a tendência era piorar, pois veja bem para onde eu estava indo. Não só para a tal junta, na Vila Militar, mas para chegar até lá tive que descer no saudoso terminal rodoviário de Madureira.

Descendo no ponto final do ônibus 701, atravessamos meu pai e eu (sim, meu pai foi comigo) o terminal e posteriormente a rua. Já de longe dava pra ver (e ouvir muito bem) um Profissional Condutor de Transporte Alternativo que berrava pra quem quisesse (e quem não quisesse) ouvir: “Vila Militar, Nova Iguaçu direto!”. Ele tinha um sotaque estranhamente forçado o que na verdade acho que é um dialeto próprio da espécie, para reconhecimento entre si.
Entramos na van, assim que sentei virei pro meu pai e disse:

– Essa porra de van não cabe a minha perna... – num tom explicavelmente estressado.
– Melhor que ir de ônibus e soltar longe. – disse meu pai no tom paciente de sempre.

Passados uns 5 minutos de espera me sobe à bordo um ser, que eu nem fiz questão de olhar a cara, me senta no banco da frente do meu e começa a puxar assunto (graças a Deus que não foi comigo) com o motorista, que comenta sobre o outdoor do show do Marylin Manson. Foi o que a porra do idiota precisava. Começou a sessão:

– Não, porque esse cara é macabro... A casa dele é toda pintada de preto. E no café da manhã ele bebe sangue. – disse a porra do ser que entrou sem eu ver nem a cara.
– Caraca! Isso é um homem? E o pior que esse show vai encher... Tem gente que gosta dessas coisas. – disse o condutor do Transporte Alternativo.

Pensei comigo mesmo: “nossa, como essas pessoas entendem das coisas...”.

Já era bem claro e como se isso tudo já não fosse o bastante, quando eu viro pra minha esquerda me deparo com um show de horrores. Sabe, o mesmo da Praça Seca? Então, eles haviam migrado! E dessa vez com uma figura que era uma mistura de Bebel com Léo Áquila. A(o) coitada(o) rebolava até não poder mais só pra atravessar uma avenida que nem era a Atlântica e muito menos a Vieira Souto. Quando passou pela van em que eu estava e o condutor gritou “Vila Militar”, a “Bebel” me solta uma frase (que vai ficar pra sempre na minha cabeça nesse dia digno de um post grande no meu blog): “Nuuuuooooooooossa, na vila militar só tem homi goxtossô!” - com a voz totalmente indefinida ela fala e sobe a rampa do trem com a “catiguria” que ninguém nunca teve e que ninguém jamais vai conseguir ter.

– Pai, que merda é essa? Você viu?
– Bebel! – parecia que tinha lido meus pensamentos.


Finalmente a van anda, e vai relativamente rápido, já que não tinha nenhum trânsito. Quando eu achei que ia me ver livre, pelo menos por enquanto de coisas não convencionais, o carinha sabe-tudo me vem com mais essa:

– Mas você sabe que o carinha lá mora num deserto né? Ninguém chega perto da casa dele, todo mundo tem medo... Ele mora no meio e um cemitério... E dorme dentro de um caixão.
– Ihh é mesmo cara? Pow, eu conheço uma galera que vai pro cemitério... Eu não gosto dessas cosias não... – respondeu o cara da van...

De vez em quando, tipo de 3 em 3 minutos, o idiota da frente reafirmava a estória dele sobre o Marylin Manson. Eu pensei em acrescentar o fato de ele ter retirado duas costelas para se boquetar, mas preferi não trocar palavras com a plebe e continuar na minha, me abstendo do assunto.

O engraçado é que eu nunca tinha reparado que a Vila Militar era tão grande. As construções são até bonitas, imponentes sabe? Mas nada que me encha os olhos e me dê vontade de servir. Lá em Madureira tinha subido uma outra pessoa que a cada batalhão fazia menção de descer pois avistava um monte de gente se apresentando, mas o “trocador” da van falava que o 15º era mais à frente. Acho que esse carinha, tanto quanto eu, não tinha confiado no tal “trocador” na hora de avisar pra descer. Aquilo me deixou muito tenso, porque eu tava preparado pra um batalhão mais à frente e aí quando esse idiota falava “é aqui?” e a van dava meia parada meu coração ia pro intestino, se é que me entendem.

Não demorou muito depois dessas meia-paradas o 15º chegou, falei pro meu pai que ele podia ir e que dali eu me virava e que pra ir embora era só eu atravessar a rua. Dei dois beijinhos no meu pai e fui pra fila de entrada enquanto ele atravessava a rua me dando tchau. Me senti como há 13 anos atrás, quando eu era uma criança no Jardim de Infância e meu pai me levava pela primeira vez na escola. Me deu um aperto no coração ver meu pai indo embora e me deixando ali... Pude reviver a sensação dos tais 13 anos atrás e entendo mais do que nunca por que as crianças choram no primeiro dia de aula.

Fiquei na fila, agora do lado de dentro e segui logo depois pra debaixo de um galpão aberto onde fizeram as perguntas que eu ouvi dizer que fariam durante semanas: “Alguém aqui é testemunha de Jeová? Alguém aqui faz faculdade?”. Como eu fiquei feliz em não estar na faculdade e como eu queria ser Testemunha de Jeová naquela hora! Mas qualquer oportunidade ia ser motivo pra eu deixar em evidência meu problema de coluna devido a queda de cabeça em uma cama elástica.

A fila andou mais um pouco e me chamaram pra me entregar um papelzinho e me mandar pra sala ao lado. Nessa mesma sala o coração faltou pouco virar água batalhão abaixo, porque era ali que meu destino nos próximos dias, meses e porque não anos, seria decidido. Ainda mais pelo fato de eu ter visto uns três garotos que estavam se apresentando que nem eu estarem encostados na parede. Fiquei querendo saber por qual motivo eles estavam ali.
Chegou a minha vez na tal salinha, o cara que tava no computador disse:

– Leonardo Azevedo? – nunca vi alguém falar tão sinsitramente. Mas acho que era impressão minha.
– Uhum – pensei “pronto, fudeu”. Balancei nervoso com a cabeça, quase tremendo.
– Ta dispensado, fica ali na parede aguardando ser chamado.

Aquilo me deu uma vontade de sair correndo e fazer coco que vocês nem imaginam, minha gente. Eu gargalhei por dentro, mas tive que manter a seriedade. Se eu passasse por mim mesmo, não me reconheceria, de tão sério que eu tava e de tão alegre que era a situação. Se tivesse uma cama elástica ali naquela hora eu não ia pensar duas vezes e ia mergulhar nela! Brincadeirinha...

Mandaram os outros que estavam na parede e eu pra uma tenda armada num canto do pátio. Eu nunca passei tanto tempo em pé esperando por algo, mas tão contente! Eu às vezes me pegava rindo com um meio sorriso na boca, mas me continha... Deram sete horas e um sinal horripilante me lembrou o sinal do Adolpho Bloch, me senti mais em casa ainda! Começaram a surgir soldados de seus dormitórios e coincidentemente tinha um garoto que estudou na minha escola antiga servindo ali. Mas fingi que não o conheci, tava feliz demais pra dividir minha alegria logo com uma pessoa desconhecida.

Não demorou muito depois das sete, um sargento, general (nunca sei a hierarquia), sei lá o que eu o cara era, veio com os papeizinhos e falando que estávamos liberados e tínhamos que ir no lugar que nos apresentamos no dia 10 de outubro com duas fotos 3x4, esse mesmo papel e com a xérox do mesmo (frente e verso) mais cinco reais para pegarmos o certificado de reservista. Ali naquela hora eu tive mais certeza do que nunca que serviço militar NUNCA MAIS e que eu era o ex-futuro soldado mais feliz do mundo.

Vim embora quase cantando. Meu MP3 nunca foi tão dispensável. Atravessei a tal rua pra vir embora e peguei o primeiro ônibus que ia pra algum lugar conhecido (Madureira no caso). Peguei o pior ônibus, um que ia pela Av. Brasil, onde coincidentemente (mais coincidências), sobe um caloteirozinho (que não estuda mais lá na escola) de jaleco do curso de Propaganda e Marketing, que é o meu curso por sinal. Quase que eu falo “meu querido, hoje não tem aula”, mas eu tava tão zen que deixei pra lá.

O engarrafamento da Brasil parecia um rio lento e tropical, tipo o do Rio Water Planet... Eu não estava nem aí com nada, tava tão feliz que até o engarrafamento tava agradável. Cheguei em casa eufórico, pulando mais que a Pitty Christina (meu cão) e acordando minha mãe que veio toda se rindo já imaginando que eu não tinha servido.

Fora essas turbulências (inclusive do vento que parecia mais um tufão durante a tarde), foi empolgante meu dia. Fora dos clichês e da rotina... Boa história pra contar pros amigos, pros filhos e rir muito depois.

Ps.: Dormir à tarde é sempre rejuvenescedor em qualquer situação!

terça-feira, 4 de setembro de 2007

Aprendendo com as diferenças.




Existem pessoas de diferentes tipos, de diferentes características, diferentes localidades e de diferentes processos de formação, principalmente processos culturais e educacionais, onde esses determinam veementemente a personalidade do individuo com um ser único e individual, aquilo que ele é.

No mundo encontramos uma grande miscigenação de todos esses tipos de pessoas: do rico ao pobre, do branco ao negro, do homossexual ao heterossexual e por que não dizer do homem a mulher?

A diferença é algo fascinante, pois ao passo que pode se tornar o enaltecedor de conhecimentos interpessoais, pode também se tornar o algoz de si mesma, tendo em vista todos os conflitos e guerras que são travados em nome de tal diferença, que muitas vezes são elementos essenciais para o desenvolvimento pessoal de outrem.

Todos nós aprendemos com as diferenças, seja do modo mais difícil, seja do modo mais fácil. Cabe a nós saber lidar com elas da maneira mais sábia e coerente, respeitando sempre o direito do próximo.